03 novembro 2006

Sentir-se




«ela».
Desde a verdura juvenil até à máscara mortal, passando pela cintura abarcável com dois palmos, sentir-se ela. Foge-se de um destino a vida inteira e eis que ele nos engole projectos de independência. Sem o ferrete da femme fatale, pode alguém ter de outros o mesmo passo, a mesma densidade de loucura, o mesmo olhar de Rasputine? Faíscas azuis libertam-se deste olhar, o corpo que se aproxima - cada vez mais fatalmente - da mortalidade horizontal sem nada de petites mortes, fujo de mim, malgré moi. Que pode a concentração transcendental de um mantra contra todas as células em revoada contrária? Sem dramas subtis de zénite ou profundos de nadir, deixar que se cumpra a natureza, contrariando-a apenas no muito pouco aproveitável da sabedoria brasileira "faça o que é bom p'ra você", nunca esquecendo o Inominável. Porque o terceiro rosto é o de uma mulher preenchida mas morta. E isso, isso é já definitivo. Brindo ao prazer, portanto; seja qual for a minha máscara mortuária, que ela tenha linhas de riso das noites sem fim à vista. Faça-se a noite em hino à vida: com um riso colado, olhos fechados, um jogo com prolongamento e sem cansaços. Antegozo d' "o que meu for, a mim virá". Vir eu à tona, cabeça fora de água, exangue e, por isso mesmo, viva por dentro, cor mudada aos olhos. Toast!